" maio 2012 / da estante

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Vai pelo cais fora




Vai pelo cais fora um bulício de chegada próxima,Começam chegando os primitivos da espera,
Já ao longe o paquete de África se avoluma e esclarece.
Vim aqui para não esperar ninguém,
Para ver os outros esperar,
Para ser os outros todos a esperar,
Para ser a esperança de todos os outros.
Trago um grande cansaço de ser tanta coisa.
Chegam os retardatários do princípio,
E de repente impaciento-me de esperar, de existir, de ser,
Vou-me embora brusco e notável ao porteiro que me fita muito mas rapidamente.
Regresso à cidade como à liberdade.
Vale a pena sentir para ao menos deixar de sentir.

terça-feira, 22 de maio de 2012



(de) vagar


Mesmo apressado é como se o tempo estivesse pingando esfumaçantemente. À medida que as horas correm pareço estacionar, lembranças correm a mente cansada. Parar e esperar tem me feito mal. Criar força e lutar tem me tornado idiota, tem me tornado insana e impassiva. Louca. Depressiva. Eu já não sei o que esperar. O que há de vir me tortura como o que já se foi, como o que já não volta e o que pode voltar. Sabendo que a todo instante o querer fará seguir, o poder fará regredir, a fé fará acreditar que tudo passa e que há o que te fortalecerá. Até acontecer o que te alentará? Sobreviverás até lá?

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Entenda!



Entre sorrisos e mais sorrisos a angústia toma lugar em cada canto da boca, difícil é saber onde estamos, saber se deve ou não sentir, saber que tem que partir de tudo e de todos.
Isolar-se tonar-se o melhor plano, estar machucado demais e não querer machucar quem ama. Fazer com que as pessoas entendam que não precisam de você e que você já pode ir embora, pode deixar-se ir sem remorso, sem culpa, sem dor.  O pior dos sentimentos estapeado na cara de quem quiser ver: rancor. O que te destrói todos os dias, mesmo que você não queira. Entender que você nada significa e para nada serve a não ser ferir quem mais ama. Assim perder a capacidade de amar e poucos restarem dentro de você e para quem se deve explicação. Pedir perdão e não ser perdoado. Ter consciência de que o ser medíocre que se é não é digno de tão sublime perdão, porque ninguém foi capaz de te perdoar, e você nunca foi capaz de pedir perdão. Nada mais podes pedir para si, tudo a perder. Ter é sinônimo de perder.

sábado, 5 de maio de 2012

Sinta, engula e... Acredite?


Colocamo-nos todas objeções, desfrutamo-nos amargamente de tentações, e ainda assim acreditamos, é como se o verbo proferisse em seu absurdo a nossa deficiência de fé.

Temportúnio

                 
Ninguém sentiu quando chegou à mim um suspiro, quando parecia-me o fim em meio aos destroços de mim, do que pude salvar do que parecia não restar. O tempo podia ter me feito enxergar, a tontura ainda me embriaga o senso de vida, as veredas me impunham um seguimento de morte. Ainda continuo por aqui, esperando atravessar o silêncio, sentindo o ódio feroz como lobo faminto, descendo as vestes da pureza, louca desvairada numa ventania sinistra, inflamando meu sangue e acorrentando-me na espera de algum tempo.

Infame

               
Havia o sol no rosto, escorria, queimava... Por dentro chovia forte, e seus cabelos embebidos lhe emoldurava o rosto.
Se caísse a sombra à sua imagem, saberia também que haveria de soltá-la, seu canto nem ecoa ao longe, a quietude, a extensão, montes aos montes, relento, aperto no peito, cheia de vazio. Dentro do sol sua sombra a protegia, água n'alma, se esvaía. Vai sofrer ainda todo instante que falta, vai morrer todos os dias e conceber-se à desgraça de viver em si, obrigar-se a ir, suportar-se vir. Consumia sua miséria, volta o silêncio à tua Senhora ou à teu Senhor, reverencia-lhe, dá suas entranhas para machucar e penetrar-lhe o sopro maligno da tua escuridão, trava-lhe em trevas, para todo o sempre, devotas À Ti mesma tua pouca fé, teu prazer morto, tua velha ferida. Contenta-te com tua infâmia, em teu ventre criastes o cadáver ulceroso de cicatrizes, arrastarás fria a teu Inferno, quente a teu Céu. Lamentações tuas, infame, infecundas o teu insólito destino, ao léu das ondas de teu sangue em brasa. Choras tua inquietude e teu martírio diante de teu Senhor, e pedes tua salvação. Condenada serás. Crucifica-te duma vez, e rendes teu espírito. Sobre teu peito atearás fogo, soluças tua ânsia, revoltas tua angústia, piras de ardor os teus pés. Desesperas. Pedes a teu Senhor que desfaça todo mal, que desperte de teu ventre o oriundo de teu choro, que arranque de ti os devaneios, que sedenta-lhes o peito de correntes amargas da branquidão, soca-lhe de afagos espinhosos. Prega-te de ti mesmo, e afoga-lhes teu pranto, insignificante, estéril e movediço.

Lembranças

                  
Quando estou reestruturando minha vida, repensando o passado que me fez mal, focando um futuro possível e sem males, recebo um surpresa não tão agradável, que me fez o irreparável, mas me ensinou bens incalculáveis. Me pôs na vida que eu deveria ter, me fez sentir o que há muito deveria sentir, arrancou-me em tanto os pudores, me fez rever velhas dores, me desencargou dessa vida, me pôs numa chegada sem partida, me disse muito sem ao menos tocar os lábios. Num olhar preciso que não preciso sobre mim, pensamentos que sonhei em terem fim, sentimentos que pensei estar... Enfim! Os pesadelos eu pensei só sonhar mal, eram apenas aquilo, o que dói, o não-real.
© da estante
Maira Gall